Eu não sei ao certo qual seria o real motivo daquelas
lágrimas, tão pouco o porquê daquele desespero mas, quando resolvi fazer parte
do primeiro grupo de mergulhadores brasileiros a descobrir o fascínio das águas
do Sudão, já imaginava que voltaria de lá com muitas imagens e principalmente
muitas histórias que ficariam por muitos e muitos tempos na minha mente. Ver
aquele rostinho infantil aos prantos, pedindo desesperadamente que nós a levássemos
embora daquele lugar, foi infelizmente uma das cenas mais marcante da viagem.
Chegar ao Sudão não é tão simples, a escolha por onde
será a viagem até o ponto de embarque no Live Abord é uma decisão muito
importante. As regras do país são severas, as exigências podem acabar
atrapalhando a realização da viagem e na prática, o desespero de não conseguir
embarcar para o destino final atordoou por alguns longos minutos a ansiedade da
viagem. Ainda no Brasil, foram exigidos todos os documentos necessários para o
embarque e, a certeza que os passaportes ficariam retidos com as autoridades
locais, desde o dia de entrada até o último dia que ficaríamos no país. Afinal
de contas, éramos o primeiro grupo do Brasil embarcando para aquela região, não
sabíamos o final desta história.
Com partida principal no aeroporto de Guarulhos, fomos
rumo a escala em Dubai, teríamos uma única noite de descanso e na manhã
seguinte o destino é Port Sudan, a segunda maior cidade do Sudão, lugar que não
traz nem um pouco qualquer característica que exemplifique este título. A saída
dos Emirados Árabes não foi nada simples. A burocracia com a documentação, que
teoricamente estaria conforme a exigência, praticamente impossibilitava o
embarque para o próximo país. As regras quanto aos equipamentos de mergulho e
fotográfico só foram vencidas depois de muitas conversas. Mas finalmente
embarcamos, cruzamos novamente o Mar Vermelho e íamos deixando a imaginação
fluir de como seria pousar naquele país de regras severas, de solo desértico e
de um mar simplesmente perfeito.
Um aeroporto tão simples, nos fez ter a certeza que
algo, de um modo geral, iria fazer valer a pena a viagem. O transfer até a
embarcação foi em grande estilo, um ônibus antigo, pintado com as mais variadas
cores possíveis, e nossos equipamentos no bagageiro do teto amarrado com
cordas, foi praticamente o nosso primeiro contato com o mundo real dentro do
Sudão mas, pelo menos o ar refrigerado funcionava perfeitamente, o que não
aconteceu exatamente no dias embarcados.
Conforme combinado, o sr Chico nos aguardava para dar os
boas vindas, fazer nossa entrada no país, o encontro com o Live Abord e reter
nossos passaportes. Um porto as margens de uma praça que mais parecia um local de
desfile do povo sudanês, lindas mulheres com seus trajes característicos,
homens deixando o tempo passar entre uma partida e outra de sinuca, tudo isso
fazia parte do cenário de nossa primeira noite naquele destino. Ainda não
zarparíamos, essa noite seria por ali, ao som de seus Tuk Tuk e ao fundo alguma
música árabe. Assim que o sol se escondeu, o cansaço tomou conta do meu corpo,
apenas um passeio pela calçada para que pudesse ver de perto a vida ali naquela
praça.
Finalmente o dia amanhece e minha alma se presenteia
com a felicidade de ouvir os sons dos motores que se misturavam com o bailar
das águas sendo cortadas pelo imponente Live Abord. É hora do briefing e assim
que a embarcação ancorar, finalmente iremos para água. No velho e bom estilo da
saída com as pangas, partimos para o primeiro mergulho. Há exatos três anos
atrás, eu estava pela primeira vez nas águas do Mar vermelho, teoricamente
desta vez não seria muito diferente, estaríamos mais ao sul de um mesmo mar
exuberante. Esse primeiro mergulho no Sudão só se diferenciaria pelo contexto
geral da viagem e por ser o lugar escolhido pela equipe de Cousteau para
construção do laboratório submerso conhecido como Pré-Continente II, isso no
ano 64. A obra conserva-se em perfeito estado até os dias atuais e o lugar, um
recife digno de elogios do lendário Cousteau. Sha’ab Rumi é uma mistura de
perfeição com o sonho, uma realidade de um recife que encantou até o maior de
todos os mergulhadores de todo mundo. A vida subaquática que o rodeia, faz
valer as centenas de horas que me ansiava desde o dia do convite para esta
expedição.
Continua na próxima postagem!
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